domingo, 7 de abril de 2013

Memória

O Sol nasce e se põe, seguido da Lua. Seus ciclos se seguem indefinidamente. Dia após dia. Os rios correm apressadamente para o mar ou desembocam, suaves, num lago, onde descansam e preguiçosamente se arrastam em direção a outro rio, outra correria. Os vegetais brilham esplendidamente sob a luz do Sol, ambiciosos por crescer, florescer, frutificar, fazer parte da alegria da vida, do milagre à volta. Em torno deles, perambulam pássaros. Doces, amáveis, divertidos. Cantos suaves, acompanhando a harmonia do vento no farfalhar das folhas, nas dobras gigantes das montanhas distantes. O mesmo vento que sussurra aos ouvidos. Que beija levemente a face. Que acaricia por dentre os botões da minha camisa entreaberta. Fecho os olhos. Entrego-me à sedução da natureza. Perco-me em doces desejos, leves afagos, românticos beijos, memórias veladas, tristezas passadas... o vento, leve como a carícia de suas mãos; o calor de seu corpo vindo do Sol; a voz que me dizia suavemente "cheguei"; a alegria de lhe ter, diluída na certeza torpe "como vai doer quando você não me amar". E afagava seus cabelos. Deslizava pela sua pele. Afundava no seu sorriso. Como podia saber que não éramos feitos um para o outro se, ao mesmo tempo, era tão bom estarmos juntos? Talvez como o brilho do Sol, que aquece a todos, mas não pertence a nenhum. E a cada dia o Sol nasce novamente, e se põe novamente. Aquece novos corações, abandona sozinhos no escuro. E segue. Inatingível, inexorável, indiferente. Simplesmente segue. Tudo mais segue. A vida segue. O rio correu, está longe, mas seus companheiros seguem atrás dele apressados, impacientes. Ocasionalmente se detêm num turbilhão, giram e giram, como os pensamentos que giram, que se detêm por um instante. E o que significa um instante na vida de um rio? Quanto tempo pode o pensamento girar até seguir novamente seu curso? Ou até o rio secar? Os pensamentos giram, sem sair do lugar. Giram pelas memórias. Sofridas memórias. Confusas memórias. Minhas memórias. Giram sem encontrar seu lugar. Não têm mais lugar. A vida seguiu, o Sol se pôs, a rosa floriu, e seu mundo acabou. Agora gira, sem saber onde parar. São apenas memórias, sem mundo, sem cara, sem gente, sem cheiro... memórias sem lugar. O Sol que agora brilha, não é o mesmo que brilhava lá. A Lua esqueceu-se de ti. Apenas você segue sem sair do lugar. Memórias, minhas memórias. Vocês não tem lugar onde repousar e por isso infestam minha mente. Não me deixam esquecer que um dia tudo foi diferente, que o mesmo Sol que agora brilha, já não brilha como em outro lugar. Que se o canto dos pássaros me enchia de alegria, agora apenas tristeza me trazem, porque fazem, de você, eu me lembrar. E saber que nosso amor se pôs e nasceu noutro lugar. Distante. Intocável. Que eu só posso, de longe, apreciar.

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